O susto da Joaninha
Joaninha tinha várias bonecas. Magrinhas, gordinhas,
pequeninas e grandotes como ela. Muitas delas foram das avós quando mais novas
ou da mãe dela. Ali era uma das suas favoritas. Muito inteligente no seu olhar,
movia-se como a menina e falava algumas coisas, ou repetia.
-
Bom dia! Disse-lhe a Joaninha
Via Google |
-
Bom dia! Repetiu a boneca numa voz baixa.
-
Bom dia, Ali!
-
Bom dia, A. Não acabou de repetir.
-
Bom dia, Ali! Repetiu a menina.
-
Eahhh! Foi tudo que a Joaninha ouvir dessa vez.
-
Não, não, não! Gritou a Joaninha. A Ali
estragou. Não pode falar. Mamãaaaaa! Gritou a menina correndo para o quarto da
mãe naquela manhã fria.
A mãe rolou entre os lençóis e as almofadas. Joaninha parou
ao lado da cama com a Ali a mão.
-
Mamã, olha.
-
O que é filha?
-
A Ali estragou, mamã. Já não fala.
-
Como assim, Jo?
-
Não fala, mamã. Eu disse-lhe bom dia hoje e ela
não acabou de responder.
-
Sim!?
-
Sim, mamã. Ouve. Bom dia, Ali!
-
Ehh! Ouviu-se sair da boneca.
-
Vês, mamã!? Estragou.
-
Vamos. Veste-te. Vamos leva-la a Doctora Boneca
a ver o que ela diz.
-
Doctora Boneca?
-
Vamos que já vês.
Joaninha pôs a Ali na cadeirinha que ela carregava quando
saia com a boneca. Normalmente, Jo vai no carro tagarelando ou a cantar com a
Ali. Hoje, foram as duas caladinhas. A menina olhava para a boneca, preocupada.
Caminharam duas quadras até à lojinha de brinquedos da
Doctora Boneca, uma casa na esquina da C12, por trás do mercado dos
Congolenses. Doctora Boneca estava sentada na esteira, à sombra da mangueira no
quintal, rodeada de bonecas de pano antigo e fusco.
-
Bom dia Dona Boneca!
-
Bom dia, Madalena! Quanto tempo…
-
É verdade, Doctora. Trago-lhe uma nova cliente.
Joaninha escondia-se por trás da saia da mãe, agarrando a
boneca atrás das suas costas.
-
Sua filha?
-
Sim, Doctora Boneca. Ela traz-lhe a Ali que
parece ter estragado.
-
Ali?
- A minha boneca, disse a Joaninha por
detrás das pernas da mãe, esticando a boneca para mostra-la à Doctora Boneca.
-
Vem cá, menina! Senta-te aqui. A velha mostrou à
Joaninha um espaço na esteira, após empurrar algumas bonecas de um canto do
Luando. Não tenhas medo que eu não mordo.
A Joaninha sentou-se ao lado da Dona Boneca. Pousou a
cadeira da Ali e entregou-a cuidadosamente agarrando-a por um braço.
-
Como te chamam? Perguntou Dona Boneca ao segurar
a boneca da Joaninha.
-
Ali, respondeu a Joaninha.
-
Tem o teu nome?
-
Não, Doctora Boneca. Eu sou a Joaninha.
-
O que é que aconteceu a Ali, Joaninha?
-
Estragou.
-
Como assim?
-
Já não fala.
-
Vai aqui à cozinha e pede que a Marcelina traga
uma canjinha para a Ali.
-
Mas a Ali não come.
-
Vai e pede a Marcelina. Ela vai dar-te o que a
Ali precisa.
A mãe acenou à menina, permitindo-a que fosse, como
indicado, seguindo-a com o olhar. A menina foi, parando à entrada, hesitando
por não conhecer a casa.
Dona Boneca abriu a caixa ao seu lado e começou a operar a
Ali.
-
A Marcelina vem já, disse a Joaninha um instante mais tarde, havendo voltado da
cozinha já mais apressada.
- A Marcelina vem já, repetiu a Ali.
- A Marcelina vem já, repetiu a Ali.
-
Aliiiiii! Joaninha estendeu os braços ao sentar-se
novamente ao lado da Doctora Boneca. Estás melhor? Ali ecóa a pergunta da
Joaninha que a aperta ao seu rosto de olhos fechados até a chegada da
Marcelina.
-
Aqui está, Doctora Boneca.
-
Obrigada, Marcelina. Agradece a velha.
Joaninha nota a mesinha de brinquedo no canto à porta da
cozinha. Dois pratos e uma terrina onde trazia a canja, como pedira a Dona
Boneca.
-
Senta-te e come. Disse a Dona Boneca. Já te
passou o susto.
-
Obrigada, Doctora Boneca!
-
Continua a cuidar das tuas bonecas e
preocupar-te com elas, como se fossem tuas amigas. Elas precisam de carinho, de
atenção.
A menina perdeu-se a comer a canjinha morna enquanto a maãe
conversava mais um bocadinho com a Dona Boneca, contente por ter a Ali de volta.
Nota: Escrito a pedido da Ali, entre fins de Setembro e princípios de Outubro 2014, quando ela esteve adoentada
Comments
Post a Comment