O mistério da tampa da chávena do boneco de neve


... Um conto baseado em factos vividos por mim.

Lourdes começou a fazer trabalho voluntário. Ela e a Laury,a irmã, estavam a viver juntas. No fim da primeira semana, Laury deixa para a irmã mais velha uma chávena do boneco de neve, com um cachecol e um chapéu que servia de tampa. Na chávena, Lourdes encontra um bilhete enrolado e atado com uma fita amarela. Lourdes desenrolou-o cuidadosamente e leu em voz alta a prece da serenidade que Laury escrevera a mão, na sua letra pequena e nítida.

Prece da Serenidade

Concedei-me, Senhor, a Serenidade necessária,
para aceitar as coisas que não posso modificar;
Coragem, para modificar aquelas que posso
E Sabedoria, para distinguir umas das outras!

Vivendo um dia de cada vez;
Desfrutando um momento por vez;
Aceitando as dificuldades,
como um caminho da paz.

Tomando, como Ele fez, este mundo
pecaminoso como ele é,
não como eu gostaria que fosse;
Confiando em que Ele fará todas as coisas certas,
se eu me submeter à SuaVontade.

Que eu seja razoavelmente feliz nesta vida
E infinitamente feliz com Ele,
para sempre, na próxima.

Amém!
Amo-te mana!
Laury

Com um sorriso nos lábios, Lourdes foi até a cozinha e lavou logo a chávena, enquanto fervia a água na chaleira. A Laury bem sabe que gosto de chá tanto quanto bebo água, pensou sorridente.

No dia seguinte, levou a chávena com ela para o serviço.Trabalhava como coordenadora de estágios de uma agência comunitária que apoiava a reunificar crianças desalojadas com as suas famílias, em colaboração com os lares/orfanatos em Luanda. O horário de supervisão era, geralmente, aonde tomava o seu chá.

Ao chegar ao escritório no fim da semana em que levou a chávena para o serviço, Lourdes encontra um bilhete colado a chávena, escrito em vermelho em letras maiúsculas.

QUAL É COISA QUE É ELA QUE COBRE ALGO INSIGNIFICANTE MAS SERVE PARA CINZAS E BEATAS?

Algo insignificante? Isso só pode ser brincadeira de muito mau gosto, pensou Lourdes, a espera de que não tenha sido um dos estagiários. Sentiu-se enraivecida pelo atrevimento. Brincadeira de muito mau gosto, disse em volta alta.

- O que é brincadeira de muito mau gosto? Perguntou-lhe a secretária administrativa da área.
- Quem esteve aqui na nossa área, Jeruza?
- Que eu saiba ninguém, disse-lhe Jaruza, perplexa com a pergunta.
- Alguém levou a tampa da minha chávena e deixou-me esse bilhete. Lourdes esticou o braço a colega que sentava-se no cubículo ao lado do dela.
- É mesmo de muito atrevimento.

Tentou Lourdes investigar por três dias, sem encontrar pistas. Desistiu consumida pela derrota pensando, ao menos deixaram-me a chávena. Quer ela como Jeruza não mais mencionaram a tampa.

Dois meses daí, ao chegar ao escritório, depois de um fim-de-semana prolongado, Lourdes encontra na sua cadeira um cilindro em papel de cartolina, aonde foi pintado uma paisagem das duas estações climáticas angolanas, com a tampa da chávena dela no topo.

Lourdes tirou a tampa e viu cair um pedaço de papel dobrado meticulosamente num minúsculo envelope. Apanhou-o e estudou o que encontrara sentando-se na mesa, pousando o cilindro ao lado da sua coxa esquerda.

Venho em paz, reconhecendo o significado que tem essa toca/tampa para si. Brincadeira de muito mau gosto a minha… Desculpa-me! Aqui deixo esse desenho como símbolo de reconciliação.

Difícil de aceitar a veracidade dessas palavras, ficou Lourdes pensativa Mas ao menos tenho o que me e importante… Cá se faz, cá se paga!

Lourdes acomodou-se e iniciou o seu dia. Arrumando as merendas que levara para o serviço, enquanto preparava-se também para comer o seu pequeno-almoço, como o fazia todas as manhãs. Não queria nem saber quem a tivera feito tal mal gosto como brincadeira. Continuava perplexa, mas ao menos tinha complete o presente que a Laury a tinha dado.

Levou a caneca até a cozinha e preparou um chá de ervas africanas, Rooibos. Enquanto esperava que a água aquecesse, apreciou detalhadamente o desenho na cartolina. No verão, as nuvens eram símbolos de paz…




Foto de Lwsinha MC


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